sexta-feira, julho 14, 2006

Acerca do blefe

"Se não descobrir o truque do jogo nos primeiros 30 minutos, você é o pato."
Provérbio mafioso

Sempre gostei de jogos de sorte nos quais também o talento pode ser definitivo. Um grande jogador de poker, mesmo em um dia ruim em termos de sorte, tende a ganhar do pato. Várias artimanhas podem ser utilizadas para que mesmo mãos ruins sejam superadas. Acho que a introdução do post pode ficar por aqui.

Assim como alguns amigos meus e outro punhado de gente, eu acredito que a própria vida é um jogo. E mais, é de certa maneira um jogo de cartas. Você pode ser um jogador, sendo ativo e indo contra a sorte. A sorte, é claro, influi, mas bons jogadores, ou os que sabem viver, acabam tendo mais sucesso. Tem patos que de vez em quando dão sorte, evidentemente. Mas mesmo sendo patos, já são dignos de nota, visto que são jogadores e não meras cartas como são aqueles acomodados, que se sentem felizes "na base dos pelos do gato, sem sair para ver o mundo" para usar expressão de Jostein Gaarder em "O mundo de Sofia". Os patos, apesar de serem patos, tem a bela atitude de dar a cara pra bater.

Pois bem. Assim como em jogos de cartas, tenho reparado que uma das coisas básicas do jogo da vida é saber blefar. E não é qualquer um que sabe blefar. Não basta ser inteligente, não basta ser frio. Tem que ter talento pra coisa mesmo. Eu nunca fui muito bom em blefar no jogo da vida, mas acho que estou aprendendo aos poucos. Nunca fui um excelente jogador de jogos de cartas (talvez tirando poker), mas meu forte nisso e em qualquer jogo de tabuleiro sempre foi blefar. Desde aqueles intermináveis jogos de War na praia até jogos de poker bem regados a Jack Daniel's hoje em dia, tenho tentado cada vez mais dominar a complicada Art of Deceiving.

Blefar é complicado especialmente contra outros bons jogadores, que usam da mesma artimanha, e, logo, tendem a saber neutralizá-la melhor. Pode-se ter que blefar em xavecos, discussões (nisso eu tou realmente ficando bom) ou situações mais simples. Blefar no emprego é para poucos (você tem que ter uma boa base no lugar pra poder ter espaço para isso. Se for considerado um mané, não adianta tentar usar desse artifício).

O blefe em discussões que podem virar brigas também requer uma certa base. Se você for mirrado, não adianta ameaçar partir pra ignorância a não ser que você reconhecidamente brigue muito bem. Como eu raramente brigo, eu tenho que basear a ameaça no meu "delicado" físico de quase dois metros e por volta de 100 kilos. Mete medo em boa parte das pessoas. Nem só de ameaça de briga pode ser o blefe. Usar dados falsos mas "passíveis de serem verdadeiros" ou mesmo observações do ambiente podem ser bem úteis.

Mas tem gente que não se sente acuada inicialmente (em geral, mas não SEMPRE, outros jogadores talentosos). Aí que vem saber usar o blefe. Tem que improvisar, pra não fazer o blefe virar cagada (nesse exemplo que eu tou dando, uma ameaça de briga que VISIVELMENTE não dá ensejo a uma briga defacto, a coisa acabar em briga pode atestar que o participante da contenda NÃO soube blefar, mesmo que ele arrebente o outro sujeito). Aí vem a argumentação, a seriedade e, principalmente, serenidade. Não leva a afinar, fique-se esclarecido. Porque também isso faria o blefe falhar; você usou dessa "manha" para encerrar a discussão com o efeito desejado por VOCÊ, sendo que algumas vezes você possa até não querer "vencer" a discussão...simplesmente encerrá-la.

O blefe bem aplicado pressupõe bom conhecimento do interlocutor, do orgulho da peça, etc. Normalmente é mais fácil blefar mais bem sucedidamente com pessoas inseguras, autodestrutivamente orgulhosas, burras etc. Pode-se dizer, pessoas manipuláveis. Isso dá até pra ver num primeiro encontro e normalmente o blefe nem é muito cheio de idas e vindas. Você pega o pato de primeira. O blefe mais tesão de se dar é aquele trabalhoso, sobre outro grande jogador; aquele blefe que implica pensamento rápido, análise acertada da situação, confiança para saber ir e vir nos seus argumentos. É realmente legal poder dizer internamente : "Peguei esse cara! E ele não é pato! Eu tenho talento!". Massagem no ego é bom sim.

Se uma superestimativa de suas potencialidades te ajuda num blefe, ser subestimado também pode ser de grande valia. Daí a atitude "Italia-Catenaccio", bem defensiva e atacando apenas nos momentos cruciais, aquela que faz os outros acharem que toparam com um mané, funcionar tão bem em qulquer campo. A surpresa faz parte do blefe. E se alguém espera uma mosca morta e topa com uma locomotiva, muito provavelmente vai ser vítima de um grande blefe.

Daí outra grande sacada dos cappi: "Faça seu adversário subestimar sua inteligência e superestimar sua burrice". Faltou falar que os conceitos sobre o adversário devem ser equilibrados para não ser presa fácil, mas ia ser querer demais.